Chá ou Café?

Chá. Chá preto, chá verde, chá mate, chá de lírio, chá de cogumelo.... para reunir os amigos, para conversar, para viajar... Histórias mais filosóficas, mais sensoriais, mais espirituais, mais... ........................................... Café. Café curto, café longo, café com um pouquinho de leite. Pra acordar, pra deixar ligado, pra tomar rapidinho no balcão. Histórias do dia a dia, teorias de 2 segundos, pirações mais terrenas...

quarta-feira, fevereiro 29, 2012

Página branca marcada com tipos pretos – uma história de chá, pra compartilhar


Olho a página branca marcada com tipos pretos. Seria mais dramático se tivesse sido escrita na velha máquina de escrever. Barulhenta. Onde é difícil apagar a verdade. Hoje,  ela fica cuidadosamente posicionada no canto da sala. Objeto de decoração. Peça de antiguidade. O ponto final no ato romântico de escrever.

O ponto final no romantismo. Quem tem tempo para se dedicar às convulsões do coração em dias de hiper-informação, mensagens instantâneas e telas sensíveis ao toque.

Sensíveis ao toque. Às vezes parece que apenas elas, as telas, tem hoje o prazer de receber o toque, a carícia dos dedos. Delicados. Ásperos. Determinados. Errantes. Trêmulos. Apaixonados. Envergonhados. A pele, ressentida, espera desesperançosa pelo contato que nunca vem.

Compartilhamos pensamentos libidinosos, compartilhamos imagens de alcova, compartilhamos intimidades, poses, olhares, trajes e sensações. Incapazes de compartilhar carinho e atenção, compartilhamos a banalidade com todos, sem compartilhar a alma com ninguém.

Volto à página branca marcada com tipos pretos. Leio de novo. Ainda é possível se emocionar com a palavra. Quisera eu conseguir emocionar mais alguém. Choro baixinho. Isso não compartilho. Que hoje em dia a gente só compartilha felicidade. Pra tristeza, a solução qualquer farmácia tem.

Queria bater no teclado até os tipos pularem da página branca. Caírem na mesa, escorrerem pelas beiradas formando uma linda poça no chão. Não é possível. Eles apenas se embaralham na minha frente. Perdem o sentido. Enfeiam.

Limpo a bagunça. Levo a mão aos olhos. Suspiro. Um dia a gente aprende.

Olho pra fora. Fixo na luz. O sol arde. O calor é intenso. Os olhos doem. Volto à página branca. Tudo o que vejo é só um clarão. Foi. Finalmente foi embora. Alívio. Manchas negras pipocam ao redor. Desaparecem. Voltam os tipos pretos. Volta a página branca. Volta a escuridão.