Chá ou Café?

Chá. Chá preto, chá verde, chá mate, chá de lírio, chá de cogumelo.... para reunir os amigos, para conversar, para viajar... Histórias mais filosóficas, mais sensoriais, mais espirituais, mais... ........................................... Café. Café curto, café longo, café com um pouquinho de leite. Pra acordar, pra deixar ligado, pra tomar rapidinho no balcão. Histórias do dia a dia, teorias de 2 segundos, pirações mais terrenas...

terça-feira, outubro 31, 2006

E fez-se a luz – uma história de chá, alumiante

“Quem controla a luz, nos controla”. Li isso em algum lugar outro dia e para mim, fez muito sentido. Depois que o homem descobriu o fogo e obteve poder sobre a luz, (antes ele dependia da boa vontade do sol, da lua e das estrelas para organizar seus afazeres), o ser humano sentiu, pela primeira vez, que poderia dominar o mundo. Equipado com mágicos poderes capazes de transformar a noite em dia, saiu em busca de suas vontades, mudou seu destino, fez história à humanidade.

Que estranho fascínio é esse que temos pela luz? Quantas vezes você não se pegou totalmente absorto e distante preso num feixe de luz. Olhando a lua, olhando as estrelas, fogos de artifício e por mais doloroso que as vezes seja, olhando diretamente para o sol, tentando entender sua grandiosidade, captar sua energia.

Na tentativa de entreter com a luz, desenvolvemos espetáculos pirotécnicos, luminosidades de cores diferentes, máquinas gigantes, telões. Quem iria imaginar que grande parte de nós, diariamente, gasta ao menos um terço do dia trabalhando em frente a uma caixa luminosa, para depois relaxar hipnotizado em frente à outra caixa luminosa no conforto do lar.

Que tanto poder tem essa luz que petrifica, paralisa como um olhar de Medusa? Perdidos entre luzes de sinalização, de segurança, faróis, luminárias e lanternas, vamos seguindo apenas os caminhos iluminados, temendo a escuridão, fugindo do que não está exposto. Não me espanta que o símbolo para uma boa idéia seja uma lâmpada acesa e que o século XVIII, chamado de o “século das luzes”, seja marcado pelo Iluminismo, um movimento de intensa criação intelectual marcado pela valorização da razão sobre todas as outras coisas, enquanto seu oposto direto, a suposta ausência de evolução por parte da raça humana, a Idade Média, seja a Idade das Trevas.

E todas as luzes de Natal? As cidades se transformam em grandes pólos luminosos, milhares, trilhares de lâmpadas, coloridas, piscando, pequenas, grandes, espalhadas, concentradas, expostas, embutidas. Crianças, velhos, jovens, adultos, todos embasbacados em frente à decorações megalomaníacas, árvores piscantes, enfeitiçados, atraídos como mariposas à luz.

Isso sem contar a nossa incontestável dependência à energia elétrica. O que seria de nós sem a geladeira, o chuveiro quente e todos os outros milhares e indispensáveis aparelhos eletrônicos que usamos e ansiamos dia após dia?

Não, de modo algum, estou aqui condenando a luz, o fogo, ou a energia elétrica. Mas é interessante pensar que, naquele momento em que o homem descobriu que poderia controlar a luz, ele também se tornou escravo dela, abrindo espaço para uma nova forma de dominação, as vezes imperceptível, mas que já faz parte até de nossos instintos. Sendo assim, se a luz nos controla, me parece aqui inegável que aquele que controla a luz tem o poder sobre todos nós.

segunda-feira, outubro 30, 2006

Porque pseudo-qualquercoisas deveriam ser impedidos de liderar – uma história de café, da hora do cafezinho

Seres humanos desprovidos da habilidade de enxergar por completo qualquer tipo de processo, seja ele de produção/criação ou qualquer outra coisa, deveriam simplesmente ser sumariamente proibidos de dar ordens.

Isso porque, quando o sujeito não sabe nem quais meios levam aos fins que ele deseja, ele também não merece possuir o direito de delegar ordens a alguém. Segue aqui um exemplo prático e cotidiano da minha rotina. Tenho certeza que trocando alguns substantivos dá para enquadrar a cena em qualquer outra situação.

Você tem que alterar, imprimir e montar um folheto. Fulano chega e diz que é SÓ fazer uma alteraçãozinha aqui, outra ali, imprimir e tá pronto. Em quinze minutos tá pronto. Aí vem a realidade, entre abrir o arquivo, fazer a alteração, salvar e preparar a impressão, se nada dá errado e se ninguém mais muda de opinião na última hora, o que acontece em 99,9% das vezes, perde-se cerca de uma hora, fácil. Não acreditando que possa levar tanto tempo só para fazer aquela alteraçãozinha, o dito cujo se posiciona atrás de você e observa todo e qualquer movimento, comenta sobre o óbvio e mantém aquele olhar fixo como se tivesse o poder sobrenatural de mover o impossível.

Finda a primeira etapa, tem-se inicio a emocionante batalha contra a impressora. Primeiro, a encarnação do demo e inimiga número 1 dos prazos cospe a folha mil vezes antes de educadamente engoli-la para a impressão. Depois, tudo parece que vai muito bem, até que, inexplicavelmente ela puxa mais de uma folha, imprime nas duas juntas e depois ainda fica com uma terceira encalacrada atrapalhando todo o movimento. Calmamente você vai lá, retira o papel delinqüente, realinha as folhas, pausa a impressão e conta quantas páginas vai ter que imprimir de novo. No fim, entre cancelar a impressão, imprimir de novo, remanejar tudo, cortar e montar, foi-se mais uma hora.

É nesse exato momento que o homem/mulher das ordens não entende como é que pode demorar tanto, quando era tão simples. Ora, se o individuo fizesse idéia de como efetivamente as coisas acontecem, de que tipo de ações e medidas devem ser executadas antes de se obter o produto final, não ficaria fazendo perguntas e já saberia suas respostas. Como é que você pode coordenar algo que você não conhece, me diz? Só porque você se acha bom em dar ordens? Só porque alguém lhe deu esse poder?

Vale a pena lembrar que, enquanto tudo isso acontece, ele caminhou como uma sombra atrás de você, na esperança de milagrosamente materializar alguma coisa, conseguindo apenas materializar o seu mau humor. No final, beltrano dá aquele sorrisinho amarelo e diz que vocês fizeram um excelente trabalho. Se o cara não faz idéia nem como realizar aquele trabalho, como é que ela acha que pode liderar a execução de tal? Isso simplesmente não faz sentido para mim. Se você não sabe como algo é feito, você definitivamente nunca poderá identificar se algo sai errado, se foi mal executado e será impossível de corrigir, não sabendo nem por onde começar.

Sem alongar ainda mais o meu mau humor, deixo aqui registrado o meu irritado protesto contra todos aqueles que vivem dando ordens, quando na realidade não sabem nem que tipo de ordem estão dando.

quarta-feira, outubro 25, 2006

Espectatriz – uma história de chá, à ribalta

Há vezes em que prefiro ser espectadora da vida, do que sua atriz principal. Me perder observando tudo, do alto da arquibancada ou através do anonimato de uma frestinha, como o resto de milhares, bilhares de personagens, nessa história, se comportam.

É como se eu não estivesse ali, como se eu não fizesse parte, como se ninguém pudesse ver. É como se eu fosse invisível, como se tudo não passasse de um filme e pior, (ou melhor, depende do ponto de vista), um filme onde eu já, mais ou menos, conheço o final.

A parte mais estranha de tudo isso é que, nessas ocasiões, eu realmente sinto como se não fizesse parte daquilo, como se não estivesse vivendo a minha própria comédia de erros, enquanto alguém mais astuto observa e ri também da minha cara. E enquanto observo o desenrolar do drama dos outros, é como se tudo não passasse de um teatro de marionetes, onde as falas são esperadas, os gestos manipulados e as reações exageradas.

Tem dias em que eu me canso de ser espectadora e me volto de volta a meu próprio papel, mas não posso evitar de notar a importância de todos os figurantes ao meu redor, como se cada um deles estivesse ali, não por acaso, mas por uma razão maior, dando mais coerência e verossimilhança à história.

Por vezes me pergunto quem é o autor de tal espetáculo. Talvez seja eu, talvez seja alguém que me observa, quiçá os inofensivos figurantes, ou talvez estejamos todos escrevendo tudo ao mesmo tempo, escrevendo e apagando, apagando e escrevendo num repensar sem fim.

As vezes tenho a impressão de que a narrativa se rearranja como um fluxo de consciência, sem muito sentido, sem muito controle, sem qualquer explicação. Ai de mim se tento pôr sentido nas coisas e acabo confundindo tudo ainda mais.

Outras vezes é como um drama de costumes muito bem arquitetado, personagens extremamente trabalhados, passados ricos em demasia, chavões desperdiçados, passos marcados, valsas repetidas.

Muitas vezes tenho que parar tudo. Mandar fechar as cortinas, chamar o intervalo. Que venham as dançarinas de cancã, que venham os comediantes baratos, que venham os micos de circo. Uma distração qualquer, uma ausência de pretensão, um esvaziar da platéia, uma confusão de fumaça, uma não importância de falas.

E entre um ato e outro, eu me divirto entre espectadora e “espectada”, entre autora e atriz, entre clown e colombina, esperando o dia em que enfim, as luzes se voltarão para a platéia e conhecerei a peça que estava sendo encenada.

terça-feira, outubro 24, 2006

Lendo o futuro através das placas (de sinalização) – uma história de café, de beira de estrada

Outro dia me disseram uma coisa que eu nunca tinha efetivamente parado para pensar. As placas de sinalização, sim, essas de trânsito, nunca te informam efetivamente onde você está, elas simplesmente fazem uma predição do futuro, tipo São Paulo a 52 quilômetros, ou curva perigosa em 500 metros.

De que vale saber se Piraporinha do Bom Jesus está a 5 quilômetros, ou 300 se você não sabe nem em que estrada você está? Uma hora, é claro, você chega em algum lugar, mas quantos metros, quilômetros você já não andou perdido em qualquer estradinha por aí simplesmente porque nada ou ninguém conseguia te informar o nome da dita cuja?

Isso quando você não é vitima de uma daquelas placas estilo pegadinha, aquelas que ficam escondidinhas, com uma seta discreta apontando o local da última saída antes daquela terrível via expressa que vai te levar diretamente para bem longe de onde você gostaria de chegar. Ela fica ali, exatamente em cima do local em que você deveria virar, mas é por essa mesma razão que você acaba perdendo-a. Porque se, como as outras, ela tivesse te adiantado o futuro, (última saída em x metros), você saberia onde virar. Mas, ironicamente, ela só te avisa em cima da hora, quando a única coisa que te resta fazer é xingar e rezar para que o retorno mais próximo seja antes do próximo limite de município.

Fica claro aqui, que o responsável pela sinalização das estradas é um grande sádico com um senso de humor impagável. O que você precisa saber de imediato, te avisam depois. O que você precisa saber com antecedência, te avisam em cima da hora. E o que você não precisa nem nunca quer saber, eles não param de te avisar.

Na realidade, acho que aquele povo que cuida da previsão do tempo é o mesmo que elabora e distribui as placas de trânsito, afinal, eles seguem a mesma lógica. Quando você já tem o seu fim de semana na praia todo planejado, te avisam em cima da hora que vai chover. Quando você não tem tempo nem para colocar o nariz para fora da janela, ficam avisando que a onda de calor vai perdurar “uma eternidade” e quando você não está nem aí se chove ou se faz frio, todo mundo resolve comentar com você da mudança óbvia e brusca do tempo.

No fim das contas, acho que é tudo um grande complô. Sempre tem um nevoeiro tampando aquela placa que você queria ver, o sol sempre te cega impossibilitando de checar o limite de velocidade e sempre chove quando o pneu do carro fura e você tem que parar ilegalmente no acostamento para finalmente descobrir que estava há mais de 30 quilômetros dirigindo na estrada errada. Apenas mais um dos grandes mistérios que nem as placas de trânsito são capazes de prever.

terça-feira, outubro 17, 2006

Maneirismos sociais e a sua paciência – uma história de café, muito obrigada

Decidindo viver em sociedade, antes de mais nada, o ser humano deve se adequar numa série de comportamentos esperados visando aperfeiçoar seu traquejo social. Ou seja, desde pequeno, somos ensinados a sorrir quando apertam nossas bochechas, ou dizem que crescemos. A dar “Bom dia” quando é dia, “Boa tarde” quando é tarde, “Boa noite” quando é noite. Com o tempo, você acaba desenvolvendo suas próprias técnicas. Ao invés de cumprimentar, usa apenas um aceno de cabeça, ou um levantar de mão, ou alguma palavrinha que ninguém entende.

Com sorte, sua educação lhe garante o mínimo de vocabulário com função fática, sua vergonha lhe garante o mínimo de cara de pau para ser simpático com estranhos não importando a situação, e seu humor não é destrutivo o suficiente para te isolar do resto do mundo permanentemente. Parabéns, você não é um ermitão e como recompensa, você ganhou uma maravilhosa estadia, até que provem o contrário, na vida em sociedade. Amigos, familiares, festas, viagens, trabalho. Tudo o que você sempre quis, agora pode e será seu.

Aí, num belo dia de chuva, você acorda e vai tomar banho. O chuveiro inexplicavelmente pifa no meio da operação e você tem que terminar de se assear com água gelada. Sai na rua e o vento vira seu guarda chuva, seu primeiro passo vai direto ao encontro de uma magnífica poça d’água. Para sua sorte, nada mais de muito ruim acontece em sua jornada e, finalmente, você chega ao trabalho. Sentindo-se miserável, molhado e levemente desarrumado, você cumprimenta o porteiro do prédio com um “bom dia” bem introspectivo, um grunhido. No elevador, encontra 3 ou 4 colegas do andar debaixo, todos conversando animadamente àquela hora da manha, com aquela chuva, tendo ainda que trabalhar. Indignado com tamanha ousadia, você nem cumprimenta ninguém. Finge que não está ali e internamente, está torcendo para que todos tenham um dia terrível e finalmente eliminem aqueles sorrisos asquerosos de suas faces.

Vencida a etapa do elevador, você finalmente chega onde deveria chegar, trabalho. Dá bom dia para a secretária, dessa vez tenta ser um pouco mais convincente, já que mais tarde pode precisar de algum favor da dedicada funcionária. Em vão, só consegue emitir um sonido desafinado. Desistindo de persistir com essas bobagens sociais, se dirige apressadamente até sua mesa, desejando com toda a força de seu ser não encontrar mais ninguém no meio do caminho. Para seu azar, naturalmente, um grupo conversa de maneira empolgada à sua esquerda e todos eles parecem incrivelmente felizes em te ver. No melhor dos humores, cada um deles lhe deseja sinceramente um bom dia enquanto você quer que eles apenas desapareçam após uma morte lenta e dolorosa. Seu “oi, como vai?” soa muito mais como “vá à merda e me deixe em paz” e o sorriso em seus lábios deixa vazar um estranho barulho de dentes rangendo.

Com sorte, você enfim chega até seu aconchegante e reconfortante cantinho de laboro. Durante todo o dia, atende o telefone com uma falsa calma, saúda co-trabalhadores com uma falsa alegria, sorri para todos que passam por sua baia com uma falsa benevolência e faz tudo que tem que ser feito com uma falsa boa vontade. Na hora do almoço, deseja “bom apetite” a todos, afinal, não importa em que estado se encontre o seu humor, você deve manter a vida em sociedade possível e aceitável, já que um dia, você pode precisar muito de tudo isso que está à sua volta.

O dia termina relativamente bem. Você deseja “boa noite” e “bom descanso” a todos e vai embora. Chega em casa e evita trocar palavras com qualquer familiar, afinal, eles são sua família, eles te amam incondicionalmente, você não precisa manter joguinhos sociais com eles para ser aceito, eles vão entender. Buscando um pouco de paz e privacidade de uma vez por todas no seu dia, faz um enorme prato de comida e senta-se sozinho e com as luzes apagadas em frente a TV. O noticiário, que alegria. A vida de tanta gente aqui e em todo mundo é tão pior que a sua, você realmente só tem o que agradecer e pensar que é bom. Sentindo-se aliviado, você começa a pensar com satisfação que o dia seguinte sim será um ótimo dia. Até que o inevitável acontece. O âncora do jornal lhe deseja “Boa Noite” e você num incontrolável acesso de fúria grita com toda a força dos seus pulmões para a TV “vai se fuder seu filha da puta miserável sem nada melhor para fazer”.

quarta-feira, outubro 11, 2006

Estratégias de guerrilha nos jogos amorosos e a fragilidade das relações – uma história de chá, sem estar adoçado

A guerra entre os sexos existe, sempre existiu e sempre existirá, isso é fato. Entretanto, com o passar dos anos, tenho a impressão de que a linha que separa esses gêneros está cada vez mais frágil, provocando conflitos cada vez mais comuns e banais.

Atualmente, acredito que vivemos numa guerrilha armada sem hora para começar, muito menos para terminar. Qualquer pequeno acontecimento pode armar uma bomba e gerar uma reação em cadeia com resultados inimagináveis. Do mesmo modo que qualquer não-ação também pode ocasionar conseqüências tão desastrosas quanto.

Vivemos em tempos de guerra. Onde as relações são volúveis, as preocupações fúteis e os interesses descartáveis. Antes de fazer qualquer coisa em relação ao sexo oposto, ou em certos casos ao mesmo sexo, (não pretendo aqui excluir ninguém) é necessário, antes de mais nada, traçar um plano de guerra. Delimitar o campo de ação do inimigo, isolar o território, ter total domínio de suas fronteiras. Descobrir onde estão seus fortes blindados, postos de comando, espiões treinados e atiradores de elite. A partir do quadro minuciosamente estudado, é necessário começar a traçar as estratégias de ataque, ações de domínio, escolher as armas de combate.

Tendo tudo isso organizado, passa-se então ao embate propriamente dito. Os desafiantes escolhem suas armas, jogam suas cartas na mesa, fazem suas apostas, preparam seus blefes. Isso, porque além de estarmos em guerra, ainda estamos jogando. E o bom jogador não só conhece muito bem suas opções e posições de ataque, como também tem pleno conhecimento da munição e jogadas ensaiadas do inimigo.

Um jogo perigoso, belicoso e extremamente delicado. Cada cartada se mostra como uma nova arma. Cada tiro trocado se desenrola como mais uma carta retirada ao léu do baralho. A cada novo movimento, um blefe. A cada blefe, um novo sentimento escondido. A cada sentimento escondido, uma perda. A cada perda, uma mágoa. E a cada mágoa, um vazio maior entre um oponente e outro, resultando simplesmente num afastamento total e irreversível entre aqueles que, ao contrario de todos os outros, estavam simplesmente, no começo de tudo, tentando apenas ficar mais próximos.

Por que fingir o que não se sente e sentir o que se finge, quando é tão mais fácil simplesmente ser o que se quer ser? Por que mascarar as intenções, jogar com meias palavras, sugerir meias vontades, deixar no ar um não sei o quê, esperando simplesmente colher algo que ainda não se inventou. Para variar, as relações são extremamente simples. Nós é que, com essa mania de querer ter controle de tudo, sobre o passado, o futuro, nos esquecemos obviamente do presente e nos perdemos em jogos de azar e azar de munições.

quinta-feira, outubro 05, 2006

A exceção das regras e suas exceções – uma história de chá, porque nem o café abriria essa exceção

Dizem por aí que para toda regra, existe uma exceção. Uma não. Várias. Eu, sinceramente, acredito que toda regra foi feita para ser quebrada, mas infelizmente, até nesse ponto, muitas vezes, caio em contradição. Porque se a afirmação “toda regra tem uma exceção” já é uma regra, qual seria a sua exceção?

Correndo aqui o risco de adentrar em um campo metafísico demais, me proponho a discutir regras, suas exceções e as exceções das exceções, aliás, como fica estranha essa palavra depois de repetida três vezes, será que eu invoquei alguma entidade mitológica dos deuses dos extremos? Melhor voltar logo ao assunto, se é que isso é um assunto.

Pois bem, deste lado estão as regras, do lado oposto estão suas exceções. Agora, se a exceção, por assim ser, também se torna uma regra, será que sua exceção correspondente seria então a regra original, ou chegaríamos a outra variável tão distante da primeira que cairia em outra classificação, a das regras novas, ou pior ainda, seria igual a uma das regras antigas já praticadas e previamente catalogadas?

Tudo isto está muito abstrato e eu realmente prefiro quando as coisas fazem um pouco mais de sentido, quando obtêm forma, quando tornam-se plásticas. Voltemos ao ponto de partida. Toda regra tem sua exceção, ou seja, um desvio. Esse desvio torna-se uma regra a medida que alguém o segue como tal. Transformando-se em uma regra, abre espaço para uma outra exceção e por aí a coisa vai se desenrolando, até que a exceção da exceção se pareça tanto com uma regra, que nem seja mais considerada uma exceção.

E aí vem a pergunta. Se as pessoas quebram as regras para serem revolucionárias, rebeldes, diferentes, originais ou o que quer mais que elas queiram, a medida que elas quebram mais em mais regras, simplesmente só vão chegando mais perto de uma regra que já estava ali, muito antes deles pensarem em quebrar a anterior.

As exceções existem, não há como negar. Entretanto, sua repetição incessante as transforma apenas em mais uma regra banal, por vezes estúpida e feita para ser quebrada. Enfim, não adianta seguir a vida tentando e se esforçando para seguir todas as regras, porque cedo ou tarde, elas serão quebradas. Como também não adianta seguir a vida quebrando todas as regras, porque cedo ou tarde, toda exceção também se torna regra.

O bom mesmo é ir levando, quebrando uma regra aqui, criando uma nova acolá, sendo chato e seguindo uma regra estúpida até o fim dos dias. O importante, no meu humilde ponto de vista, é não levar nada muito a sério demais. Nem o lance de seguir regras, muito menos o de quebrá-las ou pior ainda, desconhecer que viver quebrando regras é simplesmente uma das regras mais antigas da ordem do universo.

segunda-feira, outubro 02, 2006

Alguém dê um trato na Poliana, por favor – uma história de café, que podia ser pior

Vira e mexe eu me pego com essa maldita mania de Poliana. Sabe esse péssimo hábito de tentar ver um lado bom em tudo? Esse mesmo. Você não tem esse problema, sorte sua. Mas receio que, mesmo sem saber, você já foi acometido por alguns dos sintomas dessa doença sutil, porém avassaladora.

Você está caminhando alegre a calmamente pela rua. O dia está lindo, você não está com pressa e o clima está agradável. Você vestiu uma de suas roupas preferidas e tudo parece estar em perfeita harmonia. Sim, parece. Isso até que uma pomba delinqüente resolva se aliviar ali, exatamente em cima da sua cabeça. Numa questão de poucos segundos, aquele dia ensolarado e abençoado por um coro de anjos barrocos se transforma em uma visão dantesca, labaredas de fogo se formam sob seus pés, enquanto nuvens negras encobrem sua cabeça. Nesse momento, eis que alguém, numa vã e inútil tentativa de te reanimar, solta a pérola “não se preocupe, isso é sorte, você vai ter muita sorte essa semana”. Igual quando você pisa na bosta “magina, isso é só um sinal de sorte”, ou quando é cercado por abelhas, correndo o risco de tomar uma picada fatal e alguém vem a com a maior cara lavada e afirma com toda convicção “as abelhas trazem fortuna”. Ah sim, afortunados aqueles que são recebidos nos campos do Senhor após um ataque de abelhas africanas.

Ao inferno com tudo isso. Sim, merdas acontecem e devemos estar preparados para lidar com elas, não inventar um conto de fadas para explicar o acontecido. É claro que tudo sempre pode ser pior, podia estar chovendo estrume, mas precisa dar uma dessas explicaçõeszinhas baratas toda vez que algum desses acidentes detestáveis acontece? Não dá para simplesmente falar um montão de palavrão, xingar todas as gerações, póstumas e futuras, e esperar que a raiva passe para esquecer o episódio de vez? Um toque de Poliana as vezes faz bem, confesso. Mas toda hora não dá. É insuportável.

Você cai, tropeça e quebra a perna. Ah... pense pelo lado bom.. podia ter sido pior, você podia ter quebrado todos os dentes e fraturado umas costelas. Sim, sou um sortudo por estar usando esse gesso incômodo nesse calor úmido de 40 graus. Seu cachorro destrói o seu trabalho de conclusão de curso, o computador dá pau e o seu backup está tão atualizado que a única coisa que te resta é a introdução. Mas calma, você tem saúde, inteligência e o que importa é que você está bem, inteiro, pensante, pode escrever tudo de novo, é fácil. Não, não e não. Não está nada bem, qualquer coisa que pareça melhor do que desesperador é irritante e eu não quero ser consolado, simplesmente quero uma doze para destruir alguma coisa e tentar aliviar a minha raiva.

Tentar enxergar o lado bom de tudo deve ser uma benção, quiçá uma arte, mas sinceramente, não me agrada. Pra dizer a verdade, acho que essa tal de Poliana (me controlo aqui para escrever “tal” e não “vaca”) deve ter se casado com aquele outro FDP do Murphy. Isso porque um deles está sempre fazendo tudo que pode dar errado efetivamente dar errado, enquanto o outro está sempre tentando contornar a situação com palavras doces e teorias açucaradas.

Imagina a cena. O Murphy tá lá, passando manteiga no pão e o dito cujo, é claro, cai de cabeça para baixo fazendo a maior meleca. Aí chega a vadia da Poliana toda solícita “ai benzinho, não fica triste não, eu faço outro pra você nesse momento. E olha só, aquele pão nem era tão bom assim, tava com um queimadinho na ponta, você viu? Ia deixar a sua boca toda amarga e estragar o final do seu café da manhã. Toma, assim está bem melhor.”

Dona Poliana e seu Murphy vão ao supermercado e, obviamente, na hora de pagar, escolhem a fila que não anda de jeito nenhum, nem com reza braba. Murphy faz aquele cara de “eu te disse”, enquanto Poliana tenta contornar a situação “assim que é bom coração, enquanto a gente espera, dá para eu te contar o que aconteceu na escola do Juninho, você não vai acreditar, você nunca tem tempo mesmo de ouvir, acho que essa é uma hora perfeita, sem contar que assim você fica um pouco em pé em vez de passar o domingo todo sentado lá naquele sofá”. Simplesmente o casal perfeito, sem sombra alguma de dúvida.

E depois de tudo isso, só me resta mesmo desejar com toda força de meu ser que, um dia desses, o Murphy pegue a Poliana de jeito e os dois fiquem lá, entretidos por alguns minutos, com sorte algumas horas, e finalmente, deixem a humanidade em paz.