Manifesto do caos autoritário – uma história de café, amargo
Apesar de ter nascido e crescido na tal nova democracia brasileira, os saudosos anos 80, eu sinceramente não acredito muito na utilidade da tal democracia. Quando eu nasci, o país ainda estava sob o comando dos militares, depois vieram as diretas já e finalmente, nosso primeiro presidente “legitimamente eleito pelo povo”. Desse tempo todo, pouca coisa eu me lembro. Estava mais interessada em brincar de mês e mãe da rua, jogar intellivision e tomar leite com Brown Cow do que qualquer outra coisa. Mas, de qualquer forma, mesmo que inconscientemente, eu deveria ter me deixado levar por toda aquela empolgação da volta à democracia...
Pois bem, deveria. O fato é que isso não ocorreu. Ou melhor, até deve ter ocorrido, o problema é que, com o tempo, eu acabei por desenvolver a minha própria visão, deveras peculiar devo ressaltar, sobre a democracia.
Sinto aqui ter que desapontar mas, não, infelizmente a maioria NÃO tem sempre a razão, e a voz do povo definitivamente NÃO é a voz de Deus e eu sigo acreditando nisso até que alguém me prove muito bem provado o contrário.
Quando todas as pessoas concordam em alguma coisa, isso só significa que a maioria não tem opinião própria ou, quando tem, não possui personalidade forte o bastante para sustentar seus pontos de vista, acabando por ser influenciada, manipulada e se deixando levar por argumentos de pessoas que, astutamente, perceberam no ar tais fraquezas. Aquela velha história da maria-vai-com-as-outras.
E junto com a democracia vem sempre a sua amiguinha, a tal da organização. Ou seja, lá se vão todas as ovelhinhas atrás do seu pastor, enfileiradinhas, obedientes, balindo em ritmo e sem reclamar. Obviamente, o ser humano que decidiu que as pessoas deveriam se organizar em fila e esperarem a vez de serem atendidas era um puta cara safado e manipulador, que só estava querendo tirar proveito da grande massa que nunca sabe o que quer e acaba aderindo à maioria.
Já reparou que, nas filas do pedágio, tem sempre uma enorme e umas outras menores e as pessoas continuam entrando na fila maior sem explicação aparente? Ou então, dois restaurantes, um do lado do outro. Um deles com filas intermináveis, o outro, calmo, vazio e agradável e as pessoas seguem entrando no abarrotado. Por quê? Murphy? Ah, não venha importunar o pobre rapaz mais uma vez. A resposta é simples e sempre esteve aí. Simplesmente porque certas pessoas não acreditam nelas mesmas. Não acreditam que possam estar certas, quando o resto das outras pessoas está fazendo exatamente o contrário do que elas gostariam de fazer. Não suportam o fato de estarem sozinhas, sustentando suas posições, quando o grupo ao lado tem tantos outros membros para apoiar e defender. Mas eu repito, a grande maioria que está onde a grande maioria está, nem sequer sabe o que está fazendo ali.
Você passa horas na fila da bilheteria e a fila nunca anda. Você e o seu senso do organização, senso previamente imposto por alguém de mente muito mais autoritária que a sua. E você fica lá na fila, sem reclamar. E o amigo do amigo do amigo entra na sua frente e na frente da pessoa à sua frente. E o bilheteiro guarda um ingresso pro vizinho, pra cunhada, pra amiga da tia da sogra da namorada do irmão. E quando chega a sua vez, obviamente o espetáculo está lotado e não lhe resta opção alguma senão lamentar e aceitar que a vida é assim mesmo, não se pode ganhar todas. Oras, tudo culpa da maldita organização. Ou melhor, aqueles que foram fortes o suficiente para imporem o que queriam, seja furando lugar na fila ou fazendo uso de suas influencias pessoais, garantiram seus interesses. Enquanto o resto, a maioria, ficou fazendo o que sempre faz, parada, esperando ordens e seguindo os passos do líder, sem muito bem saber o porquê.
Você já reparou que primeiro você entra na fila e depois vai descobrir para onde ela vai? Puro e simples condicionamento. Você já está treinado a se juntar à maioria, não importa o que ela queira.
É por isso que eu venho aqui defender o caos autoritário, onde cada um vai onde quer e exige o que quer, por direito, uso capião, ou qualquer que seja o melhor argumento. O importante é que vença aquele que realmente acredite no que está fazendo, e que faça por que quer e que seja feliz fazendo.